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Brasil Social e Humanitário

Uma CPMI contra a Reforma Agrária

Uma CPMI contra a Reforma Agrária

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A burguesia agrária brasileira não tem jeito mesmo. O seu poder econômico, político e ideológico na mídia brasileira é tão grande que a deixa cada vez mais prepotente; porém, cega e burra.

Vejamos alguns dados da realidade agrária explicitados pelo censo agropecuário realizado pelo IBGE em dezembro de 2006 e recentemente publicados:

- Cerca de um por cento dos proprietários de terra no Brasil, controlam 46% de todas as terras do país.

- Apenas 15 mil fazendeiros, que possuem áreas acima de 2.500 ha, são donos de 98 milhões de hectares (equivalente a 4 Estados de São Paulo juntos).

- A concentração de terras no Brasil continua aumentando. E se desnacionalizando. Nos últimos anos as empresas transnacionais compraram mais de 20 milhões de hectares. E junto com a terra, água, minérios, etanol, usinas, madeira e biodiversidade.

- O Índice de Gini que mede a concentração de terras, no Brasil é de 0,856 e é o segundo país de maior concentração de terras do mundo.

- O Banco Oportunity, por exemplo, que opera recursos de origem norte-americana comprou em apenas três anos, 56 fazendas e mais de 600 mil ha, no sul do Pará.

- A empresa Cutrale, passou a monopolizar a produção de sucos de laranja e conseguiu levar a miséria milhares de pequenos e médios agricultores paulistas que tiveram que destruir nada menos do que 280 mil ha de cultivo de laranjas, nos últimos dez anos. Mas ela acumulou 60 mil ha, em 36 fazendas. Detém 80% de toda produção de suco do país, exporta 90% e controla 30% do comércio mundial de suco, em parceria com a coca-cola.

- Os fazendeiros vinculados ao agronegócio produzem ao redor de 100 bilhões de reais por ano. Mas estão cada vez mais dependentes do capital financeiro e para conseguir produzir esse valor tomam emprestado junto aos bancos, todos os anos, ao redor de 90 bilhões de reais de crédito rural.

- Essa produção é na verdade fruto do trabalho de aproximadamente três milhões de assalariados permanentes e temporários. É revendida para apenas 20 empresas (a maioria transnacionais) que controlam o comercio de commodities e de insumos agrícolas no Brasil.

- O Balanço dessas 20 maiores empresas que atuam no agro revelou que elas faturam sozinhas ao redor de 115 bilhões de reais por ano. Ou seja, toda aquela riqueza vai parar nas mãos deles.

- O agronegócio dá emprego para apenas 15% da população economicamente ativa (PEA) os outros 85% trabalham na agricultura familiar. Ou seja, há 18 milhões de trabalhadores rurais adultos, e destes 15 milhões estão na agricultura familiar.

- Do total de trabalhadores adultos que estão na agricultura, 80% fez apenas ate a quarta serie do ensino fundamental, e há 35% de analfabetos.

- A agricultura familiar produz 85% de todos alimentos que vão para a mesa do povo brasileiro. Já o agronegócio produz apenas commodities, ou seja, matérias primas para exportação.

-Cerca de 90% dos proprietários de terra que detêm áreas acima de 200 hectares não moram nas fazendas, mas nas cidades. Dos 15 mil maiores fazendeiros, a grande maioria mora em São Paulo e no Rio de Janeiro.

- Graças a essa aliança entre os grandes fazendeiros brasileiros com as empresas transnacionais, o Brasil se transformou em 2008, o maior consumidor mundial de venenos agrícolas. São aplicados nos 45 milhões de hectares, nada menos que 700 milhões de litros de venenos. Apenas seis empresas produzem: Monsanto, Syngenta, Bayer, Basf, Shell, todas transnacionais. Os agrotóxicos são de origem química. Matam o solo, matam a biodiversidade, contaminam as águas e viram câncer no seu estomago.

- O Brasil é a nona economia mundial em produção de riquezas. Mas está em 75º lugar nas condições de vida da população, e é a sétima pior sociedade do mundo, em desigualdade social.

- Desde a redemocratização, em 1985, mais de 1.600 lideranças de trabalhadores foram assassinadas no campo. Destes apenas 80 chegaram aos tribunais, 15 foram condenados e uns 5 mandantes e assassinos estão na cadeia. Todos os demais estão impunes inclusive os autores dos massacres de Corumbiara (1995) Carajás (1996) e Felisburgo (2004).

O que fazer para enfrentar uma realidade tão dura e injusta? Os parlamentares ruralistas que são a fina flor da direita atrasada e burra decidiram: Vamos convocar uma CPMI, para impedir a reforma agrária!!

Como diria o saudoso Florestan Fernandes, como nos faz falta uma revolução burguesa! Pelo menos.

[Caros Amigos]

Confirmaçâo do criminalizaçâo dos movimentos sociais em R.S. Brasil

Relatório do governo confirma criminalização dos movimentos sociais



Relatório do C.E.C de Defesa dos Direitos Humanos: Confirma- criminalização dos movimentos sociais

A Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos Humanos, órgão ligado a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, apurou as tentativas de criminalização dos movimentos sociais no Rio Grande do Sul.

O relatório final da Comissão, aponta 28 recomendações a órgãos dos governos estadual e federal e para o Ministério Público Estadual (MPE). Em uma reunião na manhã desta quinta-feira (26/11) na Assembléia Legislativa, o vice-presidente da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Rogério Sottili, informou que o documento é o resultado de dois anos de investigações da Comissão. Ele explicou que os trabalhos começaram após denúncias do então deputado federal Adão Pretto, que culminaram na morte do Sem Terra Elton Brum, em agosto deste ano, na cidade de São Gabriel.

O relatório foi produzido com base em depoimentos de integrantes dos movimentos sociais rurais e urbanos e contou com o auxílio de representantes da sociedade civil e do Ministério Público Federal (MPF). O relator do documento, Fernando Mattos, alertou que há um avanço da repressão por parte da Brigada Militar nos últimos quatro anos. Na conclusão de seu relatório, Mattos aponta que há, de fato, indícios de criminalização dos movimentos sociais do campo e da cidade por parte dos poderes locais. Ele afirmou ainda que os fatos mais recentes, as torturas registradas na ação de reintegração de posse da Prefeitura de São Gabriel e o assassinato do Sem Terra Elton Brun, mostram a gravidade do problema. Mattos disse que desde a tragédia de Eldorado dos Carajás, em 1996, ninguém havia sido morto pela polícia em operação semelhante.

“Mortes causadas pela polícia militar em nenhum estado desde 1996, não ocorreram em alguma reintegração de posse. Ao contrário, a Ouvidoria Agrária Nacional produziu um manual de reintegração de posse pacífica e mediada, e a Brigada Militar foi a única polícia estadual que não assinou essa iniciativa em nível nacional. Então nós nos preocupamos bastante, porque no nosso entendimento, se há a constatação de criminalização, a gente não pode permitir que isso se aprofunde e resulte em tragédias e perdas de vidas”, relatou.

Fernando Mattos apontou no relatório, a necessidade da criação de uma Comissão Estadual de Mediação de Conflitos Agrários; a revogação pelo Comando Geral da Brigada Militar da Nota de Instrução Operacional nº 006.1, que trata os conflitos agrários como caso de polícia; a suspensão pela Brigada, do processo de cadastro criminal de lideranças dos movimentos sociais; a recomendação à Brigada que adote o Manual de Diretrizes Nacionais para Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse coletiva, da Ouvidoria Agrária Nacional e a garantia às crianças dos acampamentos do MST de acesso à educação, à saúde e à alimentação.

O documento apresentado na Assembléia Legislativa ainda relata outros casos de truculência da polícia. O relatório faz referência a desocupação da fazenda São João da Armada, em Canguçu, em 2008 durante a qual a Brigada revidou com intimidações e humilhações. No mesmo ano, foram registrados atos de violência contra os manifestantes da Marcha dos Sem, no Parque Harmonia, em Porto Alegre. No documento estão também o cerco às festividades dos 25 anos do MST e a norma do MPE de fechar as Escolas Itinerantes do Movimento.

De Novo Mídia Persegue a Movimentos Sociais

 

Da Agência Adital

 

 

Desde ontem a mídia local e os veículos grandalhões, como ironizava o jornalista Sérgio de Souza, sentam a pua no MST do Pará. A parcialidade sobre a cobertura envolvendo a luta pela terra na Amazônia não é invenção desses dias. Vem de velha data, onde a omissão ou ignorância sobre a complexidade da questão serve de moldura.

A refrega envolve o movimento e o tentáculo rural do banqueiro baiano Daniel Dantas, a Agropecuária Santa Bárbara, e uma outra propriedade de tradicional família paulista, os Quagliato.

No caso de Dantas, condenado e indiciado por vários crimes no mercado financeiro, a propriedade é a fazenda Maria Bonita, localizada no município de Eldorado do Carajás, na mesma rodovia do Massacre, a PA 150. A fazenda encontra-se ocupada desde a metade de 2008.

A propriedade foi negociada pela família Mutran, que conforme o estado não poderia ter realizado a comercialização, por se tratar de terras de aforamento. Ou seja, a família tinha o direito de exploração extrativa da castanha, quando ali uma floresta existiu. Por tanto, se trata de terras publicas, que estavam disponiveis para posse apenas para explorar castanhas, arvores que há muito foram derrubadas na area (sem que nninguem tenha denunciado, apesar de ser proibido por lei!)

É a ilegalidade que conforma a maioria das propriedades rurais na Amazônia, em particular no Pará. No primeiro semestre do ano o Ministério Público Federal (MPF) anunciou que 6.102 títulos de terra registrados nos cartórios estaduais são irregulares.

Somados, os papéis representam mais de 110 milhões de hectares, quase um Pará a mais, em áreas possivelmente griladas. Os dados resultam de três anos de pesquisa dos órgãos ligados à questão fundiária no estado, através da Comissão Permanente de Monitoramento, Estudo e Assessoramento das Questões Ligadas à Grilagem (Tribunal de Justiça, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Advocacia Geral da União, Ordem dos Advogados do Brasil, Federação dos Trabalhadores na Agricultura, Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos Comissão Pastoral da Terra e a Federação da Agricultura do Estado do Pará). O documento foi apresentado no dia 30 de abril no auditório do MPF em Belém.

Desde 2006 o MST ocupa a fazenda Rio Vermelho, no município de Sapucaia, sudeste do Pará. O Grupo Quagliato, dono da Empresa Agropecuária QUAMASA- Quagliato da Amazônia Agropecuária S/A, detinha três fazendas na região, e era dona da Usina São Luiz S/A. Em Ourinhos, São Paulo, o Quagliato, processava açúcar e álcool

Em junho de 2009 o MPF e o IBAMA anunciaram multas robustas contra fazendeiros e frigoríficos por animarem a devastação na Amazônia. A maior indenização refere-se ao caso da fazenda Rio Vermelho, da família Quagliato, em Sapucaia, que pode ter que pagar mais de R$ 375 milhões. O mesmo caso vale a outra fazenda de Daniel Dantas, no município de Xinguara a Espírito Santo, que deve pagar multa de R$ 142 milhões. Além de crime ambiental a fazenda registrou a prática de trabalho escravo.

Tudo isso, se aplicado a constituição constitui condiçao de nao cumprimento da função social e por tanto deveria ser desapropriada pelo estado.

Aumento da Repressâo aos Organizaçaôes Sociais do Brazil

CPI do MST: aumento da repressão aos Sem-Terra


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Campanha contra a ofensiva da Direita

Está claro que o objetivo da CPI contra o Movimento dos Trabalhadores sem-terra é o de colocar em um novo patamar a ofensiva criminosa da direita, dos latifundiários contra o trabalhador rural sem-terra. As milícias paramilitares com jagunços e a orientação do governo para a polícia de defesa da propriedade privada com o assassinato e a dura perseguição está com tudo preparado para se aprofundar.

Como afirmam os representantes da bancada ruralista “ A idéia dos oposicionistas é polarizar os debates entre simpatizantes dos sem-terra e os defensores do agronegócio, deixando de lado o tradicional embate entre os partidos alinhados com o Palácio do Planalto e a oposição.” (Jornal do Brasil 27/10/2009). O que querem é sufocar as tendências de luta no campo. Esta CPI não tem como alvo fundamental as eleições de 2010 e o PT, mas de fato é atacar os movimentos de luta, que abarca milhares no campo brasileiro.

Como se pode ver, alvo fundamental sequer o próprio MST, mas todos os movimentos que nos últimos anos estão se distanciando da política de freio da direção do MST e da frente popular.

Fato que subordinou a luta pela terra aos para favorecer a colaboração de classe levada a frente pelo PT, antes e durante o governo Lula.

Latifundiários contra povo pobre

Segundo divulga a imprensa burguesa, os governo tenta timidamente um acordo com PT e PMDB dividindo o comando da CPI. A relatoría ficaria com o PT e a presidência com o PMDB.

Dos 36 membro da comissão, como os aliados do governo tem ampla maioria na Câmara e no Senado, os partidos governistas vão indicar 11 senadores e 12 deputados para a CPI.

A direita DEM, PSDB e PPS, ficou com seis vagas de senadores e cinco de deputados, enquanto o Psol e o PSC também poderão indicar membros para a comissão, seguindo o critério estabelecido entre as menores bancadas.

O raivoso DEM que pediu a instalação da CPI e está numa ampla campanha contra os sem-terra é o único partido que indicou os parlamentares: Abelardo Lupion (DEM-PR) e o­nyx Lorenzoni (DEM-RS), como titulares da CPI. No Senado, Gilberto Goellner (MT) e Kátia Abreu (TO), presidente da Confederação Nacional de Agricultura.

Organizar as massas contra a repressão

A realidade se impos ao MST e agora é possível afirmar que estão diante de uma encruzilhada. Se não romperem com a política do PT e da frente popular continuarão a estimular a ofensiva da direita.

A direita levanta a cabeça em todo o país como resultado da situação explosiva no campo contida pela política da direção do MST e do PT. Apenas no Pará em dois anos foram assassinados 15 líderes sem-terra e o MST nada fez.

Não é possível ter nenhum ilusão nos deputados e senadores do PT, prontos para fazer qualquer acordo para garantir a estabilidade de seu governo. O próprio Lula fez vários pronunciamentos contra a ocupação da Cutrale realizada na região de Iaras no último mês.

Apenas através mobilização política das massas do campo é que esta investida pode ser barrada.

Os movimentos populares e de luta pela terra devem ter consciência que não se trata do MST apenas. A neutralidade diante do ataque dos latifundiários nas instituições burguesas fortalece a posição da direita, como vimos no último período. Há uma escalada de repressão que começou nos locais mais isolados do País como Rondônia e Pará e que só será barrada com a luta.

MST Denuncia Perseguiçâo Política

MST denuncia perseguição política à OIT na Suíça

mst

 

 


O integrante da coordenação nacional do MST, João Paulo Rodrigues, entregou ao diretor-geral da OIT (Organização Internacional do Trabalho), Juan Somavia, e à representante permanente do Brasil junto à ONU (Organização das Nações Unidas), embaixadora Maria Nazareth Farani Azevêdo, uma denúncia sobre o processo de repressão e criminalização da luta dos trabalhadores rurais pela Reforma Agrária no país, em audiência em Genebra, nesta segunda-feira (02/11).


Em outubro, foi instalada por iniciativa de parlamentares da bancada ruralista uma CPI contra o MST, como forma de represália ao anúncio do governo federal da atualização dos índices de produtividade. Essa é a terceira CPI contra o MST instalada nos últimos quatro anos. “Estamos sofrendo uma perseguição política, que pretende atingir a Reforma Agrária, a organização do povo na luta por direitos e a democracia no Brasil”, afirmou João Paulo.

O documento apresentado pelo MST afirma que “se organiza esse grande quebra-cabeças que é a repressão aos movimentos sociais, em particular ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra no Brasil, voltado para a manutenção do desrespeito à Constituição Federal, ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais e à manutenção da injustiça nas relações agrárias”.

A denúncia foi apresentada em parceria com os dirigentes das centrais sindicais brasileiras, CUT, CTB, Força Sindical, UGT, NCST e CGTB, que entregaram uma denúncia contra procedimentos do Ministério Público do Trabalho.

Com essa iniciativa, o MST começa uma campanha internacional contra a criminalização dos movimentos sociais por setores do Poder Judiciário, do Congresso Nacional e da mídia burguesa.

Abaixo, leia a denúncia apresentada à OIT e à ONU.

A ATUALIDADE DA VIOLÊNCIA CONTRA OS TRABALHADORES SEM TERRA NO BRASIL

Derrotada a ditadura militar brasileira, o campesinato fez sua reentrada em cena, demandando acesso à terra. O país marcado pela grande extensão e pela concentração da propriedade viu-se questionado pelo volume das ações camponesas e pela radicalidade das demandas, assim como pelo reaparecimento de velhos novos atores – indígenas e afrodescendentes – e pela consciência da necessidade de um ajuste de contas com o passado e o futuro das relações de propriedade da terra que enfrentasse a questão da abundância de terras produtivas inexploradas, multidões de trabalhadores rurais sem acesso a elas e minorias ínfimas de proprietários latifundistas para quem a terra mal chega a ser fator econômico, reduzida quase sempre a fator de poder.


A busca da terra prometida por Deus e pelos homens[1]gerou uma nova forma de articulação camponesa, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra-MST, e de recuperação das áreas que não cumpriam a função social[2], as ocupações massivas[3].

O surgimento do MST e das ocupações coletivas redundou em aspectos aparentemente conflitantes, mas que se harmonizaram na realidade da luta pela terra no Brasil.
De um lado, ultrapassou-se a fase em que as ocupações eram realizadas quase que individualmente. Acompanhados de suas famílias ou, raramente, em pequenos grupos de duas ou três famílias, camponeses adentravam a mata e lançavam suas lavouras em terras públicas, ali permanecendo o tempo que a sorte lhes permitisse, sobrevivendo do que logravam obter das plantações, da coleta e da caça. Até que um dia eram descobertos pelos pistoleiros a mando de alguém que se intitulava possuidor da terra e o encontro terminava quase sempre na expulsão ou em choupanas queimadas e cadáveres insepultos devorados por animais, ossadas incorporadas ao húmus da floresta, vez ou outra descobertos, agora, quando a “civilização” chega àquelas paragens.

Se o pequeno número de ocupantes favorecia seu ocultamento na mata, e se esse ocultamento possibilitava uma sobrevida como resultado do desconhecimento da ocupação pelos grileiros, tinham também em si a raiz de sua derrota pela incapacidade de resistir à força do latifundiário e pela garantia do acobertamento de sua violência. Esse tipo de ocupação, ademais, tinha a característica de mascarar os dados reais da luta pela terra, eis que esses pequenos conflitos resolvidos pela morte no fundo da mata não chegavam ao conhecimento da sociedade, ficando quase sempre limitados aos próprios grileiros e matadores e às autoridades que os acobertavam.

O surgimento do novo movimento camponês deu visibilidade aos conflitos: não se as podia esconder as ocupações massivas, nem era possível agredi-las tão facilmente. Essa maior visibilidade, contrastando com o silêncio tumular – diga-se – anterior, permitiu muitas vezes que se atribuísse à presença do MST numa determinada região o surgimento dos conflitos pela terra, quando, na verdade, ela apenas era responsável pela retirada do véu que os encobria.

Essa nova fase da luta camponesa se iniciou exatamente no período em que a sociedade mais fortemente manifestou seu repúdio à violência e à tortura, e também esse fator algemou as mãos do latifúndio limitando o direto exercício da violência que praticava anteriormente, obrigando-o a lançar mão de seus agentes no aparelho policial, tendo sido esse, principalmente, o motivo que fez com que, na segunda metade da década de 80 a repressão às demandas camponesas fosse feita pelo exército privado do latifúndio, mas já em substituição pelo organismo policial, reservada à polícia local uma primeira ação, em geral sem muita preocupação com a legalidade, com vistas a impor aos camponeses o medo do Estado protetor do latifúndio.

Depois, quando ineficaz esta ação policial atemorizadora, o que ocorria quase sempre nas condições do atuar coletivo dos trabalhadores, foi ganhando corpo a intervenção do Ministério Público e do Poder Judiciário, num primeiro esforço para dar contornos legais à repressão contra os camponeses, adequada aos novos tempos que se apresentavam como "democráticos" e submetidos ao "império da lei".

Ao longo de vinte anos, houve no Brasil, um aprofundamento e alargamento desse processo, com a busca incessante por parte do estatado de mecanismos mais adequados ao exercício da repressão aos movimentos sociais. O qual não cessou, um instante sequer, de buscar articular fórmulas que ultrapassam os marcos da lei e outras que se mantém dentro de suas lindes.

A eficácia apenas parcial das articulações da violência direta do latifúndio com aquelas dos organismos estatais – policial, do Ministério Público e do Poder Judiciário -, fez surgir uma terceira fase, aquela em que estamos no momento, em que se busca, mais que tudo, uma deslegitimação do movimento camponês e o estabelecimento de uma repulsa social contra ele, apresentando-o já não apenas como violento, mas, principalmente, como agente de corrupção.
Não se trata, repita-se, de substituição de uma fórmula por outra, mas do surgimento de novas fórmulas que se vão articulando com as antigas, ganhando procedência sobre estas, sem que nenhuma delas seja, porém, abandonada.

Da repressão que se quis fora dos marcos legais, verifique-se, a título de exemplo, que embora se tivesse buscado o apoio policial para a violência contra o MST, as armas dos pistoleiros não foram abandonadas. Nos Estados de Pernambuco e Pará, principalmente, ainda hoje grande número de trabalhadores sem-terra caem vítimas das balas dos pistoleiros a serviço do latifúndio.

No Estado de Pernambuco:

Em Junho de 1997 pistoleiros atacaram um acampamento de trabalhadores sem terra, no Engenho Camarazal, ferindo cinco trabalhadores e matando Pedro Augusto da Silva e Inácio José da Silva. O Estado Brasileiro foi denunciado perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos por garantir até hoje a impunidade dos criminosos, entre os quais são apontados policiais e pistoleiros;

Em Agosto de 2006, dois dirigentes do MST em Pernambuco, Josias Sales e Samuel Barbosa, foram assassinados por pistoleiros no município de Moreno.
No dia 06 de julho deste ano (2009) os Sem Terra João Pereira da Silva, de 39 anos, José Juarez Cesário da Silva, 21 anos, Natalício Gomes da Silva, 36 anos, José Angelino Morais da Silva, 43 anos e Olímpio Cosmo Gonçalves foram mortos por pistoleiros quando participavam da construção das casas no Assentamento Chico Mendes, Agreste de Pernambuco. Além dos cinco mortos, um outro trabalhador sem terra, Erionaldo José da Silva, ficou ferido.

Em Julho de 2000, José Marlúcio da Silva, 47, foi morto com um tiro no peito disparado por policiais que reprimiram uma manifestação de trabalhadores sem-terra em Recife. Também nesse caso o Estado vem cuidando de garantir a impunidade dos matadores.

No Estado do Pará:

No dia 17 de abril de 1996, um destacamento da Polícia Militar do Estado do Pará, sob o comando do Coronel Mário Colares Pantoja assassinou 19 trabalhadores rurais sem terra que faziam uma marcha pela reforma agrária, no que ficou conhecido como o Massacre de Eldorado de Carajás. O Poder Judiciário do Pará garantiu a impunidade de todos os policiais envolvidos, com exceção do Coronel Pantoja e do Capitão Raimundo José Almendra Lameira que, embora condenados encontram-se ainda hoje em liberdade.

Em março de 1998, os trabalhadores rurais e dirigentes do MST Onalício Araújo Barros e Valentim Serra, conhecidos como “Fusquinha” e “Doutor”, foram assassinados, por pistoleiros que atuavam em parceria com policiais militares. Depois de executarem uma operação de reintegração de posse, junto com policiais militares, alguns deles participantes do Massacre de Eldorado de Carajás, pistoleiros seqüestraram Onalício e Valentim e os assassinaram, lançando os corpos na estrada. Até hoje o inquérito se encontra paralisado, numa forma de exercício da garantia estatal da impunidade aos crimes do latifúndio.

No dia 2 de fevereiro de 2005, pistoleiros e fazendeiros assassinaram Irmã Dorothy Mae Stang em Anapu, no Pará. Três pistoleiros foram condenados pelo crime, sendo que dois deles já se encontram em liberdade. Nenhum dos fazendeiros foi condenado.

Não apenas no Pará e em Pernambuco, porém, segue o exercício direto e através de policiais da violência contra a população camponesa.
No sul do Brasil, no Paraná, são grandes empresas multinacionais como a Syngenta que organizam a morte dos trabalhadores, o que levou a que pistoleiros a serviço da empresa, agindo sob título de  “empresa de segurança”, no dia 22 de outubro de 2007, matassem o dirigente sem-terra Valmir Mota de Oliveira, o Keno. Os pistoleiros da Syngenta estão sendo protegidos pelo Estado. Os trabalhadores sem terra que reagiram ao crime estão sendo processados.

Em Minas Gerais, no dia 29 de outubro deste ano (2009), a Freira Dominicana Geralda Magela da Fonseca, conhecida como “Irmã Geraldinha”, foi ameaçada de morte por fazendeiros da região do Vale do Jequitinhonha, pertencentes à família Cunha Peixoto, por apoiar as demandas do MST. As ameaças a Irmã Geraldinha repetem aquelas feitas a Irmã Dorothy Stang antes de seu assassinato e repetem outras que foram feitas contra trabalhadores sem terra posteriormente vitimados no chamado
 
Massacre de Felisburgo.

Em 20 de novembro de 2004, 18 assassinos encapuzados, coordenados pelo latifundiário Adriano Chafik, foram ao acampamento Terra Prometida, em Felisburgo, região do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais e atiraram contra homens, mulheres e crianças. Cinco camponeses Sem Terra Iraguiar Ferreira da Silva, Miguel José dos Santos, Francisco Nascimento Rocha, Juvenal Jorge Silva e Joaquim José dos Santos foram mortos. Mais 13 pessoas, incluindo crianças, foram baleadas e cem famílias foram desalojadas.

No Rio Grande do Sul, no dia 21 de agosto, a Brigada Militar (polícia militar estadual) matou o trabalhador sem terra Elton Brum da Silva durante a desocupação de uma área no município de São Gabriel. Embora houvesse informações que o disparo fora realizado pelo comandante do 2º RPMon de Livramento, Ten. Coronel Flávio da Silva Lopes, a Brigada Militar foi eficaz em não deixar provas.

Da repressão que o suporte do latifúndio disse se realizar dentro dos limites legais, quer a repressão policial, quer aquela de que se incumbiram os agentes do Ministério Público e do Poder Judiciário das comarcas do interior, fregueses de cama e mesa do latifúndio, foram se frustrando ante uma advocacia popular que se foi organizando e estreitando laços com as organizações camponesas, e encontrou formas técnicas de exercer seu papel, derrotando passo a passo as fórmulas jurídicas que foram buscadas para impedir o reconhecimento da legalidade da demanda pela reforma agrária.

O processo de criminalização dos movimentos sociais, nome que, entre nós damos às ações de agentes estatais, como de políticos e da mídia, visando a reprimir os movimentos sociais e seus militantes como criminosos ou criar condições para que tal repressão se exerça, não cessou, porém, e nem tem como cessar porque o que buscamos, de nosso lado, é o cumprimento das normas constitucionais que determinam a realização da reforma agrária, enquanto buscam os latifundiários e seus apoiadores impedir a realização do mandamento constitucional.

Por esse motivo, mais recentemente, e principalmente a partir do atual governo, as forças do latifúndio tem dirigido seus esforços para, sem deixar de matar, prender e torturar trabalhadores sem terra, produzir uma estigmatização do MST, que resulte num abandono por seus apoiadores e, simultaneamente, a destruição de sua articulação.

O meio utilizado para isso tem sido a articulação dos diversos elementos, promotores de justiça e magistrados vinculados ao latifúndio, parlamentares e agentes contratados da mídia.

Em dezembro de 2003, primeiro ano do governo do Presidente Lula, e com vistas também a atacar a atuação do governo e evitar o cumprimento de seus compromissos de candidato com a reforma agrária, a bancada ruralista no Senado e Câmara dos Deputados instalaram uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito declaradamente destinada a investigar as atividades do MST e de organizações e pessoas que o apóiam.
 
Dois anos depois, em dezembro de 2005, o relatório final da Comissão foi rejeitado por uma maioria de descontentes com o diagnóstico aprofundado da situação agrária de nosso país e as diversas sugestões apresentadas para que a Constituição brasileira fosse cumprida. Os dissidentes apresentaram um relatório que, mais do que o próprio MST, buscou criminalizar organizações da sociedade civil que apóiam a reforma agrária, chegando ao cúmulo de pretender que as ocupações de terra fossem tipificadas como crime de terrorismo, com o que terrorismo no Brasil seria identificado como ocupação de terras, já que não existe, entre nós, esse tipo penal.

Já em 2006, a bancada ruralista no Senado, propõe a instalação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito, que foi instalada em março de 2007 e ficou conhecida como CPI das ONGs, com o objetivo declarado de pressionar as entidades que apóiam o MST.

Embora essa Comissão ainda esteja em funcionamento, uma vez mais a bancada de defesa do latifúndio volta à carga neste mês de outubro, propondo e logrando a instalação de uma terceira Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, para pressionar o MST, as atividades de apoio a ele e o próprio governo do Presidente Lula, acusando o MST de apropriar-se de recursos públicos, através de entidades que estabelecem convênios com o governo.

É que em agosto deste ano o Presidente Lula assumiu o compromisso de assinar o decreto de atualização dos índices de produtividade. Estes índices são importantes para o cumprimento do dispositivo constitucional que fala da reforma agrária, porque é com base neles que se avalia se uma determinada propriedade cumpre o requisito do “aproveitamento racional e adequado” sem o que não será atendida a exigência de observância da função social da propriedade.
 
Os atuais índices foram fixados em 1980 e tiveram como base o censo agropecuário de 1975. O estabelecimento de novos índices deverá levar em conta a média de produtividade das microrregiões entre 1996 e 2007. Como os latifundiários preferem deixar a terra improdutiva, para tê-la apenas como reserva de valor ou de poder, muito mal cumprem os índices estabelecidos em 1980, o que torna o latifúndio, do ponto de vista constitucional, alvo de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária.

Pretende a bancada do latifúndio, assim alcançar o triplo objetivo de colar no MST a imagem de movimento de corruptos; estabelecer uma fissura no apoio que a sociedade brasileira e muitos parceiros nacionais e internacionais brindam às aspirações camponesa, e, finalmente, fazer o governo recuar em seu intento de promover a atualização dos índices de produtividade das propriedades rurais.

Essas medidas dos defensores políticos do latifúndio contam sempre com a mais forte divulgação da mídia, eis que, no Brasil, a maioria dos donos de jornais são também proprietários rurais ou partilham interesses com eles.

Com essas atitudes não apenas se visa lograr o enfraquecimento da demanda pela terra, como a destruição da própria articulação dos camponeses sem terra brasileiros.

Que este é o objetivo da repressão ao MST vê-se da atuação coordenada desses mesmos agentes políticos e da mídia.

No Estado do Rio Grande do Sul, ali mesmo onde a Brigada Militar evoluiu do cerco, prisão e espancamento para o assassinato de trabalhadores sem terra, o Poder Judiciário viola seguidamente o direito de manifestação, ordenando à força policial que impeça marchas de trabalhadores.

Num episódio ocorrido no ano passado, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul deixou vazar ata de reunião do Conselho Superior em que diversos promotores se articulam para usar o poder estatal contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, acoimando este de violar a segurança nacional.
Em seguida a isso, o Ministério Público Federal propôs ação penal contra oito trabalhadores sem terra, acusando-os de crime contra a segurança nacional, processo que ainda está em curso, no mais claro caso de criminalização de um movimento social:

“O MST é réu num processo político. (...) A denúncia oferecida contra os oito militantes do MST na Justiça Federal na comarca de Carazinho é base de uma ação política, porque os réus são, ali, acusados de violação aos artigos 16; 17, caput; 20, caput e 23, I, da Lei de Segurança Nacional”

... “De quatro dispositivos penais utilizados, o primeiro criminaliza a pertinência a uma organização política; o segundo criminaliza a ação dessa organização política; o quarto criminaliza a divulgação de seu ideário, e o terceiro é aquele cujo objetivo é apenas o de intitular de terrorista a associação política que se quer destruir.
No plano jurídico a eleição da Lei de Segurança Nacional tem o condão de proibir o exercício da ampla defesa, uma vez que obriga cada um dos réus a justificar todas as ações de qualquer integrante da organização a que pertença, podendo - em tese - virem a ser condenados no Rio Grande do Sul por algum ato que tenha sido praticado por outro integrante da mesma associação - mesmo sem seu conhecimento - num remoto vilarejo do Amazonas.

Mas, e é o que nos parece mais importante destacar, sendo os réus acusados de pertinência a uma organização de que se diz ser criminosa, é a própria organização que está, na verdade, sendo acusada - criminalizada - sem que lhe seja dada a possibilidade de defender-se. Quanto aos réus, são eles na verdade meros peões eleitos aleatoriamente, eis que qualquer um dos milhares de integrantes do MST poderia ser igualmente adequado para figurar na denúncia, já que ainda que pessoalmente nada se possa provar contra eles, o simples fato de admitirem ou ser provada sua filiação já justificaria a ojeriza do MPF no Rio Grande do Sul.

Tanto assim é que, admita-se a hipótese, ainda que todos à exceção de um negassem sua adesão ao MST e esta não ficasse provada, o fato de um único a admitir e por isso ser condenado, já implicaria a existência de uma decisão judicial estabelecendo que teria ele participado de ‘associação, partido, comitê, entidade de classe ou grupamento que tenha por objetivo a mudança do regime vigente ou do Estado de Direito, por meios violentos ou com o emprego de grave ameaça’.
O que implicaria dizer que o MST seria uma tal ‘associação, partido, comitê, entidade de classe ou grupamento que tenha por objetivo a mudança do regime vigente ou do Estado de Direito, por meios violentos ou com o emprego de grave ameaça’.

Resulta, assim, evidente que ademais de se estar criminalizando o MST como entidade, como movimento social, está-se procedendo judicialmente de modo a impedir que esse movimento se defenda nos autos do processo, permitindo-se o MPF e a Justiça Federal eleger os oito cordeiros para o sacrifício da democracia.”[4]


Essa mesma articulação que integra alguns promotores de justiça com procuradores da república, trouxe à casa a imprensa latifundista gaúcha e setores da magistratura, de modo que o Ministério Público ajuizou ações civis pleiteando o despejo de acampamentos de trabalhadores, a imprensa fez a defesa da medida e o judiciário a deferiu, liminarmente, o que constitui um absoluto contra-senso, já que se os trabalhadores ganharem a ação, ao final, já não haverá possibilidade de retomar os acampamentos. O que denuncia, por si só, a intenção malvada por detrás da medida.

Essa mesma articulação integrou também o governo do Estado do Rio Grande do Sul, pleiteando e obtendo o Ministério Público o fechamento das escolas que atendiam as crianças acampadas e assentadas. Depois do fechamento, que implicou deixar milhares de crianças sem acesso à educação, o mesmo promotor responsável pela violação dos direitos humanos daqueles infantes ameçou processar os pais que não matriculassem e conduzissem as crianças às escolas distantes às vezes dezenas de quilômetros do local onde se encontram acampados ou assentados.

RESUMO

Não arrefece, antes se sofistica, a repressão contra as demandas camponesas.

Na atualidade, os inimigos da reforma agrária que a Constituição Federal ordena seja feita articulam diversos tipos de ações repressivas.
Exercitam a violência valendo-se do braço armado do latifúndio no Pará e em Pernambuco, principalmente, mas também em Minas Gerais, com o rosto do pistoleiro.
Permitem-se matar com o uniforme das empresas de seguranças constituídas pelas multinacionais voltadas à produção de organismos geneticamente modificados, no Paraná.

Juntam no mesmo ambiente os assassinos e torturadores com a farda da Brigada Militar gaúcha, com os sofisticados meneios do Ministério Público estadual e federal, a condescendência cúmplice do Poder Judiciário e o assente cúmplice do Governo do Estado no Rio Grande do Sul.

Voltam-se a estigmatizar como corruptos o MST e seus parceiros, visando ao rompimento desse suporte, pela palavra dos mais descredenciados porta-vozes do latifúndio mais arcaico, através de sua articulação no Parlamento e nos tribunais de contas.

Cada um desses elementos, cada um dos pedacinhos com que se organiza esse grande quebra-cabeças que é a repressão aos movimentos sociais, em particular ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra no Brasil voltado para a manutenção do desrespeito à Constituição Federal, ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais e à manutenção da injustiçã nas relações agrárias.


[1] A Constituição da República Federativa do Brasil trata, no Capítulo III, da política agrícola e fundiária e da reforma agrária. Ali se determina, no art. 184, que “Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.”
[2] O Art. 186 da Constituição Federal afirma que “A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
[3] O surgimento do MST recupera a experiência das Ligas Camponesas, anteriores à ditadura militar, de realizar ocupações massivas de terras violadoras da função social da propriedade.
[4] FON FILHO, Aton; FIGUEREDO, Suzana Angélica Paim. Estratégias de Criminalização Social, in Direitos Humanos no Brasil 2008. São Paulo: Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, 2008.
 
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Motivaçao da Perseguiçaô ao MST em Brasil

Entrevista - "Querem desmoralizar quem faz luta social nesse país"



José Dirceu entrevista João Pedro Stedile

Segundo Stedile, "o principal objetivo da CPI do MST é provar que o governo vai destinar dinheiro para o MST para fazer campanha para a (ministra) Dilma Rousseff", o que, na realidade, constitui-se na construção de mais um factóide pela mídia e oposição.

A Comissão é também, na avaliação de Stedile, uma resposta dos setores retrógrados da sociedade brasileira à vitória dos movimentos do campo que, junto ao governo, conquistaram a alteração dos índices de produtividade utilizados pelo INCRA.

Quanto ao episódio da ocupação da fazenda do grupo Cutrale e a derrubada de laranjais, Stedile reconhece que houve erro, mas aponta a superexposição do episódio na mídia. Denuncia, inclusive, que a invasão da casa de funcionários e a quebra dos tratores por ocupantes da fazenda é uma mentira. De acordo com o relato de Stedile, as imagens exploradas pela mídia foram feitas muitos dias antes que começassem a ser apresentadas e que aqueles que as fizeram aguardaram o momento que julgaram mais oportuno para exibi-las e criar o sentimento que levou ao recolhimento e obtenção das assinaturas parlamentares para a CPI.

Membro da direção nacional do MST - e também da Via Campesina - Stedile faz um diagnóstico da situação agrária no país. Fala sobre a importância da agroindústria e critica a ausência de uma política clara e focada na agricultura familiar em detrimento do agronegócio. Este, segundo o economista, está hoje monopolizado nas mãos de 20 empresas, 70% delas, transnacionais. Nesta entrevista, o ativista também analisa a contexto americano após a vitória e posse de Barack Obama e o próximo ano eleitoral. Mais urgente do que declinar apoio a um candidato, observa, é a discussão de um projeto de desenvolvimento nacional que inclua, de vez, a reforma agrária na agenda.

Entrevista

 

  Zé Dirceu - Qual a avaliação que você faz da reforma agrária no governo Lula?

Stedile - É difícil fazer esse balanço isolado do contexto maior da disputa na sociedade brasileira, hoje, entre dois modelos de produção agrícola, o agronegócio e a agricultura familiar.

O agronegócio, na nossa avaliação, é hoje uma aliança de classes entre os fazendeiros capitalistas, as empresas transnacionais e os bancos. Sua produção depende cada vez mais do crédito financeiro. Tanto é que para produzirem R$ 90 bi, eles tiram no Banco do Brasil, R$ 85. Se não tiver esse dinheiro, não produzem porque não têm capital próprio.

Por outro lado, há o modelo da agricultura familiar, diversificado e com base na mão de obra familiar, no uso intensivo da terra e voltado para o mercado interno. A reforma agrária só tem sentido se for para fortalecer esse segundo modelo. Na realidade, o que houve no governo Lula, foi um embate permanente entre esses dois modelos, com ministros dos dois lados. Por mais que se diga “é possível a convivência dos dois”, o governo precisava ter uma orientação política clara: “a minha prioridade é a agricultura familiar e o agronegócio que vá para o mercado."

Isso ele não fez. Deixou que as forças do capital agissem por conta própria na agricultura, o que construiu barreiras, porque o capital foi se fortalecendo com esse modelo do agronegócio. O resultado disso veio agora no Censo Agrícola do IBGE. Nos últimos dez anos - parte do governo Fernando Henrique e todo o governo Lula - houve uma incontestável concentração na propriedade da terra e no controle da produção agrícola.

O MST utiliza um dado econômico revelador: o agronegócio conta com 300 mil fazendas com mais de 200 hectares e com 15 mil latifundiários que detém fazendas acima de 2,5 mil hectares e possuem 98 milhões de hectares. Esse é o conjunto do agronegócio que produz R$ 90 bi do PIB agrícola no país. Se você olhar para quem eles vendem, descobrirá que 20 empresas, hoje, controlam todo o comércio agrícola brasileiro, tanto o de insumos (para financiar a produção), quanto o de commodities. Dessas 20 empresas, 70% são transnacionais e o PIB delas – segundo dados do Valor Econômico - atinge R$ 112 bi a R$ 115 bi.

Claro que tem a margem de lucro. Mas podemos perceber o movimento do capital. Toda a produção do agronegócio é concentrada por 20 empresas que acumulam essa riqueza que vem da natureza. Nisso destaca-se, também, o movimento do capital que levou a uma maior oligopolização da agricultura. Há vários segmentos que se constituem em oligopólios, um nos fertilizantes, outro nos venenos agrícolas, outro nas máquinas, no comércio etc.

Por exemplo, nós somos os maiores produtores de soja mundial enquanto território, mas vai ver quem exporta. Quem controla a soja no Brasil, hoje? Cinco ou seis empresas a Bunge, a Monsanto, a Cargill, a Dreyfus e a ADM do Brasil. Elas ficam com a maior parte da margem de lucro. É por isso que nós até damos risada, porque a burguesia agrária - essa que se diz representante do agronegócio - não tem consciência de classe para si. Se tivesse, teria que se unir com os camponeses e os trabalhadores agrícolas, para juntos, enfrentarmos essa espoliação feita pelas transnacionais. Mas não, ela prefere se unir exatamente com as transnacionais e dar pau em nós e na reforma agrária. Esse é o contexto e o governo Lula, como é um governo de composição de classes e de uma correlação de forças muito equilibrada, é o reflexo dele.

Pensando em uma proposta de desenvolvimento nacional, qual o papel de cada setor no campo, considerando o agronegócio, a agricultura familiar e a reforma agrária, processos em andamento, nos próximos anos? Num governo que tivesse condições de fazer mais políticas...

O grande desafio que temos nesse período histórico - nem é conjuntural – é que o Brasil precisa de um projeto que reorganize a economia para resolver o problema do povo brasileiro. Um projeto que, do ponto de vista político, recupere as massas como atores políticos. E a reforma agrária está emperrada justamente porque só fazer assentamentos nos moldes tradicionais do INCRA não tem futuro, porque está descolado de um projeto. A reforma agrária só tem futuro se for parte de um projeto de desenvolvimento econômico, social e político de todo o país.

Se fizermos a reforma agrária com a agricultura popular dentro desse projeto, precisaremos de uma nova concepção que parta de alguns princípios e vontade política. Por exemplo, (por esse projeto) nós vamos fixar o homem no interior, combater o êxodo rural. As cidades brasileiras não agüentam mais esse inchaço. Nós faremos um processo de distribuição de renda para que os trabalhadores tenham mais dinheiro e comprem mais produtos da indústria, ativem o mercado interno. Dentro desses parâmetros - parte de um projeto diferente e prioritário - qual seria o nosso papel enquanto agricultura familiar?

Primeiro: evidentemente que em algumas regiões do Brasil, você tem que priorizar o processo de distribuição de terras. Não precisa ser em todo o país. Nós temos terra para todos, mas em algumas regiões, é preciso uma intervenção do Estado, uma intervenção clara que combata o latifúndio e garanta uma democratização do acesso à terra. No Mato Grosso do Sul, por exemplo, há terras férteis, todos os climas, mas precisamos da intervenção do Estado para fazer uma grande reestruturação fundiária. Na Zona da Mata no Nordeste, a mesma coisa. É um absurdo continuarmos com a cana de açúcar, há 500 anos espoliando aquele povo. Aquilo é semiescravidão. Portanto, é preciso regionalizar, o que aliás está em todos os processos de reforma agrária.

Segundo: é inviável distribuir terras sem combinar com a agroindústria. Ela é a única maneira de o camponês aumentar sua renda, porque se continuar produzindo apenas matéria-prima, ele não sairá da pobreza. Então tem que haver um grande programa que leve a agroindústria para o interior. Este sim é e deve ser um componente do projeto nacional.

- Ao invés do BNDES dar dinheiro para grandes multinacionais como a Nestlé, Parmalat, por que não fazer um grande programa de pequenas agroindústrias?

Não há problema de escala na agroindústria. Não é como uma fábrica de automóvel que exige 30 mil automóveis/dia. Pode ser uma usina de 5 a 30 mil litros, por exemplo. É para isso que precisamos dos milhões dados à Nestlé. Então, que se faça um programa para a agroindústria. E como ela é pequena, de pequeno agricultor, tem que ser sob a forma da cooperativa. Com isso, já elevaríamos o nível de consciência, porque quando o cidadão participa de uma cooperativa ele se transforma em outro cidadão. Participa de assembléia... E tem emprego para o jovem - porque o jovem, filho de camponês, não quer pegar na enxada. E ele tem razão, tem que estudar. Se houver uma política de agroindústria no interior, ele terá emprego como tratorista, analista, trabalhador de informática. Você leva profissões escolarizadas para o meio rural, ao invés de trazer a população do meio rural para as cidades.

Quarto componente do nosso projeto: a educação. Nós temos que democratizar a educação. O dado do censo agropecuário é uma porrada na nossa cara: 30% dos trabalhadores rurais brasileiros são analfabetos; 80% não terminou o ensino fundamental. Isso é inaceitável. A reforma agrária é inviável se junto você não entrar com a escola. É isso que vai libertar as pessoas, politizá-las e transformá-las em cidadãs. Qual é a política atual? Por exemplo, financiar peruas e vãs para tirar o jovens do interior e trazer para a cidade. Isso é uma loucura, uma agressão cultural, econômica e um desperdício de dinheiro. O menino fica duas horas para ir e mais duas para voltar.

Quinto aspecto: mudar a matriz tecnológica do campo. Ao invés de utilizar a matriz atual do agronegócio - já condenada porque baseada só em mecanização intensiva e agrotóxico que não tem futuro (eles mesmos dizem isso) – temos que mudar para uma matriz que consiga aumentar a produtividade do trabalho e também a física, dos hectares, sem agredir a natureza. Genericamente, nós utilizamos o conceito de agroecologia. As pessoas a concebem através de técnicas agrícolas para aumentar a produção do trabalho e física, sem agredir o meio ambiente.

A vantagem do Brasil é que nós temos já um suporte científico acumulado, nas universidades, inclusive, que nos dá base científica para fazer a agroecologia. Recentemente visitei o sítio Catavento, uma área recomendada pela querida Ana Maria Primavesi, uma das grandes cientistas e agrônomas brasileiras a meia hora do aeroporto de Viracopos (Campinas-SP). Lá, 36 hectares produzem hortigranjeiros sem nenhum grama de agrotóxico. É uma maravilha. Todos os dias eles enchem um caminhãozinho com três toneladas de produtos. Portanto, está mais do que provado, nós temos conhecimento científico para esse tipo de produção.

Aproveito, inclusive, para fazer uma denúncia. Em relação aos produtos orgânicos, os supermercados já perceberam que classe média está cada vez mais consciente de que a saúde vem em primeiro lugar. Aí vem a colocação clássica: “produzir orgânico é muito caro”. Isso é mentira. Muito pelo contrário! Produzir orgânico é mais barato. O problema é que como as redes de supermercados estão monopolizadas e já sacaram que o produto orgânico é um nicho de alta renda, colocam a taxa de lucro lá em cima. Fui lá em julho e esse companheiro do sítio Catavento me mostrou: estava produzindo tomate em pleno inverno com uma estufa. Ele estava vendendo para o Pão de Açúcar a R$ 3,70 o quilo de tomate e a dona Maria estava comprando a R$ 17 o mesmo tomate em São Paulo. O supermercado sacou o nicho e colocou sua taxa de lucro lá em cima. Não é mais caro.

Nós podemos produzir em escala, já temos tecnologia. Um dos especialistas que diz isso é o prof. Luis Carlos Pinheiro, ex-presidente da EMBRAPA. Inclusive, ele está nos assessorado no Paraná para produzirmos em áreas 500 a mil hectares leite orgânico sem nenhum tratamento químico de medicamento para as vacas.

- Nesse quadro que você descreve, como fazemos reforma agrária, na base da pressão e da luta, é completamente irracional. Assentar 300 pessoas aqui e mais 300, duzentos km lá na frente, é inviável. E quanto à assistência técnica, estrada, educação na zona rural, melhorou alguma coisa além do crédito para a agricultura familiar? Afinal, a questão da assistência técnica é fundamental na agroindústria.

Há dois aspectos, o primeiro foi o desmonte que o Fernando Henrique fez. No caso da política agrícola foi mais sério, porque eles acabaram com todo o serviço público agrícola. Portanto, pegamos essa herança maldida. No caso da assistência técnica, o governo Lula ampliou os convênios para que o­nGs e cooperativas dessem essa assistência. Resultado: o público atendido aumentou, mas o método continua um atraso.

Nós defendemos que só é possível universalizar e ter uma direção política para a assistência técnica se for estatal.

- Um órgão nacional?

Um órgão nacional, que faça convênios com as EMATERs (empresas estaduais agrícolas de assistência, tecnologia e extensão rural). Contrate os funcionários para esse serviço público pela CLT. Não precisa de concursos públicos, nem de estabilidade. Pode até colocar alguns condicionantes, por exemplo, o sujeito para ser agrônomo da assistência técnica tem que morar no interior, ou não pode morar em cidades com mais de 50 mil habitantes. Hoje, temos mais de 400 entidades conveniadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) voltadas à assistência técnica. Isso a direitona não vê, fica procurando apenas as que são do MST. Porém, isso não resolve o problema, apenas amplia o público. O problema só se resolve com uma assistência técnica pública.

- No que houve melhorias?

Na Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) que voltou a ser uma empresa de abastecimento. A CONAB tinha sido sucateada completamente e sua recuperação é o melhor legado que a gestão Lula deixará, porque ela conseguiu formatar novos programas voltados exclusivamente para a agricultura familiar. Aí, nota-se a diferença. Quando você tem uma empresa pública que atua com uma orientação e quando não tem. Não é para todo mundo, mas para o pequeno agricultor. Então, a CONAB está desenvolvendo vários programas de compra, seja antecipada, seja direta do agricultor. Isso é tudo o que o camponês precisa para trabalhar, produzir e saber que tem gente que irá comprar.

O camponês é produtor, não é vendedor. Quando tem que ir para o mercado está ferrado. Repito, uma empresa estatal com um sistema econômico montado dá certo. Aí tem que ampliar, botar dinheiro em cima, porque todo o dinheiro que você botar na CONAB vira alimento e vai impulsionar esse ciclo.

Combinado com a revigoração da CONAB, temos a lei dos 30% - ou seja, 30% da merenda escolar tem que ser de origem da agricultura familiar. Essas duas medidas, CONAB e os 30%, foram avanços muito grandes. Em terceiro lugar, sem dúvida, o programa Luz para Todos, e espero que até o fim do governo seja praticamente universalizado o acesso à energia elétrica.

Nós também apresentamos dois programas complementares à política agrícola que tiveram pouca ressonância. O primeiro foi o programa de habitação - muito difícil - em que procuramos misturar o INCRA com a Caixa Econômica Federal (CEF). Veja que nem há problemas de recursos. Com 15 mil nossos companheiros constroem casas de dar inveja à classe média urbana. Mas falta desenvolver uma metodologia. Nós precisamos construí-la nos próximos meses para universalizar. Começamos brigando, já no primeiro mandato (do presidente Lula), conseguimos avanços no segundo e acredito que teremos construído umas 40 mil casas. Mas, isso não é nada perto do que significa um programa como esses. A primeira coisa que uma pessoa quer é uma casa com luz elétrica. Isso fixa o homem no campo. Se eu sei que meu primo está pagando aluguel para morar numa favela na cidade, por que vou largar minha casa? Essa é uma condicionante também para os filhos e envolve uma série de questões, auto-estima, saúde etc.

O segundo, também apresentamos um grande programa de reflorestamento. É barato. Nós poderíamos fazer um programa de dois hectares por pequeno agricultor e você refloresta esse país, melhora a qualidade de vida, combate as mudanças climáticas, inclusive, caminhando na contramão do agronegócio que quer acabar com as reservas para desmatar ainda mais. (O reflorestamento) evita essa estupidez que fizeram em Santa Catarina, o­nde não aceitam mais os 20 metros em cada margem de rio.

Se 2 milhões de pequenos agricultores plantarem 2 hectares, serão 4 milhões hectares só aí.

Por ano. Aí o cara começa a perceber a mudança da qualidade e diz: “os outros dois, mais outros dois, eu vou plantar”.

- João Pedro, em relação à educação, não teve nenhum programa novo, pedagogia nova para a educação rural e no campo nesses seis anos e meio (governo Lula)?

Do ponto de vista de concepção, nós tivemos sorte. Os dois mandatos do governo Lula contaram com ministros que tem uma visão diferenciada. Do ponto de vista de filosofia da educação mudou. É outro papo. Estamos negociando com um governo que tem percepção, mas você não consegue universalizar as políticas para o meio rural.

Talvez agora com o novo padrão salarial dos professores, nós tenhamos uma mudança, que ainda não é perceptível. Há professores do Piauí que ganham R$ 75 reais/mês Então, a lei (piso nacional de R$ 950,00 para professor instituído pelo presidente Lula) dará um salto na qualificação dos professores. Também contamos com a metodologia em programas pontuais do Programa Nacional de Educação para Reforma Agrária (PRONERA), mas que não conseguiu universalizar.

- Qual o grande contribuição do PRONERA?

Ele tem uma metodologia, a da alternância - uma conquista nossa - para os jovens do meio rural, seja para filho de assentado, seja para o do pequeno agricultor que ainda não tem acesso, ou para professores do meio rural. Você tem que criar cursos superiores na forma de alternância porque o cidadão não pode entrar no vestibular comum e vir para a cidade todas as noites na escola. O ensino superior no meio rural tem que ser diferenciado.

Primeiro, porque o jovem terá de ir para a cidade todos os dias; segundo, os melhores cursos estão nos municípios acima de 300 mil habitantes; terceiro, se ele resolver todos esses impasses, ao terminar o curso, não volta mais.

Então, o que é a alternância? Você tem dois meses de férias, depois concentra um período com aula, daí volta a ter o trabalho normal como professor ou militante e daqui a três meses volta de novo. Com esse programa – conquistado ainda no final do governo FHC, sob muita crítica, porque diziam que era “picaretagem” – durante a gestão Lula, nós consolidamos uma experiência. Hoje, podemos provar que a alternância não altera a qualidade. Muito pelo contrário, ao concentrar o conhecimento em períodos, você pode trazer especialistas daquela área. A alternância consumou-se como um método.

Agora, o PRONERA hoje é um departamento com só três funcionários dentro do INCRA. Administra recursos alocados para universidades públicas e depende, evidentemente, da boa vontade da universidade. Nós temos que conquistar cada curso. Sem falar que se um promotor elitista entrar na justiça alegando que aquele curso é discricionário, dependendo do juiz federal que está no plantão, o cara dá uma laminar e o curso é suspendido.

Por exemplo, o único curso de direito que temos na universidade de Goiás Velho – feito com vestibular e inclusive com a presença do ministro Eros Grau, na inauguração, público e notório que se trata de uma universidade de qualidade, federal - os alunos fizeram vestibular, submeteram-se ao método da alternância e o promotor resolveu entrar na Justiça. Esse tipo de coisa gera um problemão! Você tem que recorrer, o INCRA tem que entrar. Então, qual é a nossa reivindicação? O PRONERA tem que ser um programa do MEC que consiga universalizar. Aí ninguém precisa ir lá convencer a universidade. Ela já deveria oferecer dentro do seu plano de trabalho, esses cursos na forma de alternância.

Isso nós estamos corrigindo. Quero também citar como um lado positivo, as três universidades que estamos criando agora uma com o MERCOSUL, a Fronteira Sul e a Universidade Federal do São Francisco em Petrolina (PE). A Fronteira Sul, se fosse pela nossa vontade, daríamos o nome de Universidade Federal Guarani, porque o território é o mesmo (das missões indígenas jesuíticas, no Rio Grande do Sul). Seria uma bela homenagem aos nossos antepassados que habitaram aquele território. E ela vai ser a primeira universidade federal com campus em três estados.

As três universidades têm uma vocação rural e estão mais em diálogo com os movimentos sociais. Nós, portanto, estamos insistindo para que na grade delas, em seus cursos, já se incorpore a experiência da alternância - na forma de freqüentar, no tipo de curso. Não pode ser engenheiro agrônomo apenas, mas tem que ser um engenheiro formado em agronomia agroecológica. Na área de educação o que precisaremos fazer é isso. E precisamos de uma campanha séria para erradicar o analfabetismo no meio rural.

  - A oposição conseguiu o número de assinaturas necessário para que fosse instalada a CPI do MST. Como vocês estão avaliando isso?

 

Nós vemos de duas formas: primeiramente, ela está dentro do contexto maior da luta de classes no Brasil. Parte daquela parcela da direita parlamentar brasileira, encrustrada lá no parlamento, que vive querendo criar factóides para antecipar a disputa eleitoral. Como o próprio deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) revelou, o principal objetivo da CPI do MST é provar que o governo vai destinar dinheiro para o MST para fazer campanha para a (ministra) Dilma Rousseff. Isso é ridículo! Mas, ele falou isso na tribuna. Revela, então, as motivações ideológicas dele, ou seja, criar factóides para fazer uma disputa eleitoral e política besta.

Um segundo aspecto na análise dessa CPI, aqui mais da luta de classes, é que eles quiseram peitar o governo quando nós fizemos essa parceria na portaria para mudar os índices de produtividade. Estes precisam ser atualizados por força de lei. A lei agrária determina – a de 1993 – que os índices tinham que ser atualizados a cada dez anos. E os índices atuais que o INCRA usa são de 1975. Uma piada.

Então eles quiseram dar o troco. E contra o governo, não contra nós, para criar um constrangimento, um jogo de troca aí. Tudo contra a possibilidade de atualizar o índice de produtividade. Então se começa a CPI num palanque ideológico contra nós. Evidentemente, sempre que instalam uma CPI fazem o que querem. Todas as entidades que estão eles estão dizendo que tem problemas já foram investigadas pela CPI da s o­nGs e tiveram sigilo quebrado. É como se diz no interior, eles estão vendo chifres em cabeça de mula. Mas, esse é o papel da direitona que quer proteger os seus privilégios.

- Como vocês estão vendo a pesquisa da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) sobre assentamento rural?

  Isso não merece nem comentário. É uma fraude que não tem pé, nem cabeça. Não é nem uma amostra representativa. Entre oito mil assentamentos que há no país, eles (a CNA) escolheram só nove e ao seu bel prazer. Um deles, em Pernambuco, era da época da ditadura, emancipado em 1975.

A única explicação que me vem é que a CNA fez algum jogo de aliança política com o IBOPE, talvez pagando dívidas do serviço que o IBOPE fez na época da campanha da Katia Abreu (senadora do DEM do Tocantins). É a única explicação que nos ocorre para tamanho absurdo. A isso (à pesquisa) todos os pesquisadores sérios reagiram. Isso depõe contra o IBOPE. O que ficou claro é que ele perdeu sua credibilidade. Como ele pode ter se prestado a esse tipo de jogo rasteiro? Pior ainda, divulgaram a pesquisa deles uma semana depois do Censo Agropecuário que não é uma simples pesquisa – no censo, os pesquisadores do IBGE vão em todos os estabelecimentos agropecuários desse país.

A pesquisa da CNA, repito, não tem pé, nem cabeça. De 8 mil assentamentos, pegaram nove. Um total de mil famílias de nove assentamentos, num universo de 1 milhão de famílias em oito mil assentamentos.

- Sobre o episódio em São Paulo, na fazenda do Grupo Cutrale, qual a avaliação que você está fazendo? A mídia conservadora o transformou em escândalo, durante quase uma semana, ou mais, isso ocupou os principais noticiários. Qual a sua avaliação, houve erros na ocupação da fazenda?

A CUTRALE que tem mais de 30 fazendas em São Paulo, somando mais de 50 mil hectares, está em dívida com a Justiça Federal. Aquela área foi comprada de um grilo e eles sabiam. Eles partiram para o risco de comprar uma área grilada, contando com as influências políticas que tem na República do Brasil. Como estão acostumados com o monopólio da laranja, encheram de laranja para consolidar que a área era produtiva etc. Mas toda aquela área o­nde houve a ocupação - nem é só da Cutrale - é o chamado grande grilo (terras griladas) do Monção. A origem desse grilo é de terras que a União comprou em 1910 - portanto houve dinheiro público na compra da área original – para um projeto de colonização para famílias japonesas que não deu certo. Então, as terras foram ficando e houve esse grilo. A ocupação feita agora pelos sem-terra tinha a vontade política, o objetivo de fazer essa denúncia. Nisso a ocupação foi eficaz.

Agora, o fato de terem derrubado laranjais foi um erro dos companheiros que estavam lá. Nós que estamos no meio da briga, entendemos o desespero das famílias que estão há cinco anos querendo ter a terra e sabem que essa terra é grilada. O INCRA mesmo disse: “essa terra é da União”. Então o cara, o sem-terra chega na fazenda e quer plantar feijão. Evidentemente, a direita soube explorar muito bem esse fato, a partir de um erro nosso.

Mais dia, menos dia, iriam pegar qualquer erro nosso e exponenciar ao máximo. É o caso das imagens (exibidas na mídia). Elas foram feitas no dia 28/09, eles pensaram "quando vamos usar?" E esperaram, dias e dias, para fazer essa superexposição. Aquilo não foi uma reportagem sobre a ocupação, apresentada no dia em que ela ocorreu. Fora o fato de aquilo ter sido filmado pelo serviço secreto da PM. Não foi nenhuma reportagem da Globo que estava lá.

Um segundo aspecto: todas as outras imagens de depredação de trator, invasão das casas dos funcionários são mentira. Aquilo é manipulação. Nós os desafiamos publicamente a constituirem uma comissão independente - e com o Ministério Público, se quiser - e a irem lá e fazer a perícia para descobrir desde quando esses tratores estão desmontados. Isso é muito fácil de verificar. Que a comissão pergunte para as famílias (de empregados do grupo Cutrale) se algum sem-terra entrou na casa deles.

Mas, houve o erro, evidentemente, e com esse erro, a burguesia da elite econômica, que tem o monopólio da comunicação, está explorando. E nós estamos pagando caro, porque com isso, criaram o sentimento que levou ao recolhimento e obtenção das assinaturas para a CPI.

- O ex-ministro da Fazenda tucano, Luiz Carlos Bresser-Pereira e o ex-presidente da República, José Sarney, hoje presidente do Senado, apontaram tanto no caso da CPI, quanto na pesquisa dos assentamentos feita pelo IBOPE, por encomenda da CNA , a tentativa de criminalizar o MST. Qual a a avaliação que vocês fazem?

Esse tema da criminalização nós temos que entender direito como é usado. Não é uma coisa que houve, ou que há, numa época de ditadura. Nós já estávamos na democracia quando o latifúndio, para se proteger, iniciou um processo de assassinato e de violência física contra quem lutava pela reforma agrária. Esse período nós já passamos. A violência física diminuiu, até por conta da nossa forma de organização. A criminalização agora é muito mais no sentido ideológico e político. É com o objetivo de desmoralizar quem faz luta social. Esse é o sentido da criminalização do MST e dos demais movimentos sociais.

Daí porque a Rede Globo, o Estadão e a VEJA se transformaram no principal instrumento dessa fase de criminalização. Na fase anterior, eram as armas; agora, o método de tentar nos desmoralizar é através da imprensa. Nós temos tido o cuidado de não criar uma paranóia. Mas, o objetivo desses veículos e daqueles cujos interesses eles representam é muito mais no sentido de deslegitimar e desmoralizar quem faz a luta social. Independente de quem a fizer. Eles também fazem o mesmo quando tem ocupação de sem teto e outras coisas. A tentativa não é de criminalizar só o MST, é criminalizar todos os movimentos sociais.

É, agora, nas manifestações das favelas em São Paulo, nas dos bairros na periferia, contra a PM. Dizem que tudo é baderna. É a maneira de desqualificarem o caráter social e político da manifestação contra a violência da polícia e contra a falta de atuação do Estado. Os jornais só dizem que é baderna e que tem que ser reprimido. Para eles, está tudo certo (a repressão) e ainda registram “infelizmente morreu uma criança”.

O que eles fizeram em relação a áreas em que há despejo, por exemplo, o naquela área em Embu.

Aquilo foi articulado para ter apoio dos meios de comunicação. É um exemplo da polícia para ser aplicado no país depois. Vão calcar no eleitorado de direita, conservador. Dizer que o bom é aquele exemplo do Serra em São Paulo.

- Da governadora Yeda Crusius no Rio Grande do Sul também. A dona Yeda já começou (a governar, em 2007) sem base social. E como ela se posicionou?

  Transformou a Brigada Militar (PM gaúcha) em cão de guarda do capital. Chamou os setores do Ministério Publico fascistas, claramente afinados com sua proposta ideológica e, financiada por grandes grupos econômicos, tentou impor um governo ditadorial. Ela se desmoralizou porque ficou evidente. No governo dela ficou tudo tão centralizado, que ao ultrapassar o limite da corrupção, veio a público e ela não pode controlar. Controla a parte do ministério público estadual, mas não o federal que, inclusive, fez as denúncias (de improbidade administrativa e manipulação de concorrência e licitações) contra ela.

Acho, então, que tanto o artigo do Sarney quanto o do Bresser Pereira foram duas manifestações das mais lúcidas desse campo da elite intelectualizada brasileira, porque eles comentaram a razão dos fatos e não simplesmente a questão ideológica.

- Qual a avaliação política que você faz da atuação do MST nesse período do governo Lula? Houve fortalecimento? O movimento está mais ou menos forte, mais ou menos organizado, com mais ou menos bases e apoio da sociedade?

Nos últimos anos o MST consolidou um acúmulo de forças própria. E foi correta a nossa política em relação ao governo Lula, de manter autonomia política para resguardar a saúde que deve ter um movimento social. Ou seja, nem caímos num adesismo de "agora, como elegemos o Lula..." – toda a base dos sem-terra votou no Lula – nem nos transformamos em puxa-sacos, ou chapas-branca como se diz. Ao mesmo tempo, não caímos no que certos setores da esquerda caíram de “ah, o governo Lula não conseguiu mudar a política econômica, então vamos para a oposição e tudo o que vier do governo Lula é ruim”. Alguns movimentos sociais fizeram essa inflexão. Foram para a oposição. O que nós dizemos é que o papel de apoio ou oposição é para partidos políticos. Movimento social tem que ser autônomo. Seja qual for o governo ou o Estado, temos que ter autonomia.

Nós pagamos caro por essa política. Amigos que queriam que fossemos adesistas, nos chamaram de esquerdistas. E os esquerdistas disseram “não, vocês são muito adesistas”. E difícil, mas nós estamos convencidos de que essa foi a política que, inclusive, nos salvou, porque senão, provavelmente, o movimento teria tido sérios problemas de crescimento. Essa foi a situação.

Agora, em relação à reforma agrária, penso que ela não depende mais do MST. No começo do governo Lula, havia aquela euforia. No início de 2003, em torno de 200 mil famílias foram para acampamentos, porque havia uma vontade política da nossa parte e achamos, "agora com o Lula", que haveria o reacenso da massa. E não houve.

Então, a reforma agrária não depende mais do MST, mas de uma nova correlação de forças na sociedade. Depende de um reacenso do movimento de massas porque a classe trabalhadora que vive no campo é minoritária. Nós não alteramos mais a correlação de forças. Ela só irá ser alterada se houver movimentação social na cidade.

Essa é a nossa tragédia. Nós somos um movimento com unidade, temos clareza política, sabemos o­nde queremos ir, mas não temos força própria suficiente para alterar a correlação. Temos que esperar que a turma da cidade também faça um movimento que reative o movimento de massas e que aí sim, altere a correlação de forças para pressionarmos a realização de uma reforma agrária mais rápida.

Assim, os avanços da reforma agrária não dependem nem do MST, nem só da luta social no campo. Dependem da luta social no Brasil inteiro.

- Como vocês estão vendo a eleição de 2010, na medida em que apoiaram direta ou indiretamente a candidatura Lula, e levando em consideração as conseqüências para a América Latina, se o projeto político que o Lula representa for derrotado no Brasil?

  Não temos feito um debate mais eleitoral. Estamos tendo cuidado com isso. O nosso debate interno ainda é sobre a política geral, a luta de classes e a correlação de forças. Em termos gerais, te respondo pelo que é da tradição da nossa política: primeiro, manter nossa autonomia; segundo, continuar nosso trabalho político e ideológico de estimular – e é assim que nossa militância se comporta – o eleitor a sempre votar tanto em nível federal, quanto estadual, quanto municpal, nos candidatos mais progressistas e que defendem a reforma agrária; terceiro, há uma vontade e decisão política de barrar a volta do neoliberalismo.

Estamos e somos contra os projetos de restauração do neoliberalismo. Sem dúvida, o MST estará nas primeiras trincheiras da batalha. Fazemos questão de ajudar a contribuir para que o neoliberalismo não se restaure aqui no Brasil.

Os jornalistas perguntam: “vocês são da Marina, da Dilma, do Ciro etc”, o que respondemos é que não nos cabe discutir nomes agora. O que temos que estimular na sociedade brasileira é a discussão de um projeto para que ao redor dele as pessoas votem com consciência.

Nós não caímos nos simplismo de vontades eleitorais, ou partidárias, ou por afinidades pessoais. Tem gente que diz: "pessoalmente a Dilma é muito parecida com o Ciro... " Isso não explica nada! Então, até para não cair nesse tipo de reducionismo, nós achamos que o debate político a ser feito daqui a até outubro do ano que vem tem que ser sobre a necessidade de um projeto para o país, para que as pessoas saibam o que está em jogo e que tipo de projeto nós temos que fazer avançar daqui para a frente. Esse é o debate que estamos fazendo entre nós.

Evidentemente, que no caso do Rio Grande do Sul, a batalha será mais dura, porque por todo o uso que fez da Brigada Militar e do ministério publico estadual, o projeto da Yeda (Crusius) foi não só o da restauração do neoliberalismo, mas dos fascistas. Depende de cada Estado, o maior ou menor engajamento da militância. E isso se dará, também, em função das candidaturas estaduais. Os governadores tem muito peso nas lutas sóciais do campo, já que quem nos reprime são as polícias estaduais.

- Como o MST é um movimento com grande inserção internacional, inclusive pela Via Campesina, como vocês avaliam o cenário internacional após dez meses da eleição de Barack Obama e um pouco também sobre a América Latina e a relação com as eleições do ano que vem?

  Nós estamos muito preocupados. Estamos vindo de dez anos de avanços das forças progressistas, mas esse avanço registrado a partir de 1999 com a subida do presidente Hugo Chávez (Venezuela) até hoje, não veio acompanhado com o reacenso do movimento de massas. Talvez, na Bolívia aconteceu, mas nos demais países não. Isso criou uma dificuldade maior. Ao se dar conta de que as massas não vieram para o reacenso, para participar mais da atividade, evidentemente, o império está tentando reestaurar o seu projeto para a América Latina.

Os EUA tinham sido derrotados nesses dez anos. Foram derrotados na ALCA e agora tentam recompor esse projeto, que inclusive, independe da postura pessoal do Obama. O projeto do império é o do capital imperialista, do Estado belicista norte-americano. Há alguns dias, ouvi uma palestra na qual o orador dizia que toda a tentativa da economia norteamericana de sair da crise é aumentando a indústria bélica. Nem é pela saúde, nem por um Bolsa Família, eles poderiam criar uma bolsa família para os pobres norte-americanos e incentivar o mercado interno ou frear as importações da China. Não. A alternativa principal que o capital americano está tomando para sair da crise é o aumento da sua produção bélica e com isso, ter mais armas e munição.

Isso é um perigo, porque eles vão estimular conflitos até para reativar sua economia. Nesse cenário, nós vemos os EUA acelerando, mudando o passo. O caso de Honduras, por exemplo, todos sabemos que a base americana se envolveu, o embaixador se envolveu. No Panamá, idem. Essas bases da Colômbia (seis norte-americanas) são uma ofensa a todo o continente, um caso inadmissível.

Nessa questão concordamos com a avaliação do Chávez, de que é uma tentativa de transformar a Colômbia numa Israel na América do Sul. Sobretudo uma tentativa de levar a uma guerra fria entre a Colômbia e a Venezuela. É o pior dos mundos porque obriga a Venezuela a gastar dinheiro público em armamento, tanque e helicóptero ao invés de comprar casa e construir metrô.

- Então, estimula-se uma guerra fria regional para barrar o processo venezuelano. Pelo que se vê pelo Chile e o Peru, trata-se de reativar as direitonas locais para tentar retomar o controle. Não se sabe até que ponto essa mesma direita americana vai insuflar nossas eleições.

É possível que aqui no Brasil também. Com isso, o tom ideológico aumenta.

 

     

*José Dirceu de Oliveira e Silva - Ex-líder estudantil, ex-ministro, político e advogado

Ato em Defesa da Reforma Agrária

Ato em Defesa da Reforma Agrária

 

 

contra a grilagem de terras públicas
contra a criminalização dos movimentos sociais

mst

 

 

O Movimento dos trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) vem a público convidar diversos setores da sociedade para participarem de um ato em defesa da Reforma Agrária e do MST, contra a grilagem de terras públicas e contra a criminalização dos movimentos sociais.

 

 

As diferentes reações, manobras político-midiáticas, e a articulação da bancada ruralista para a criação da CPI com o objetivo de criminalizar o MST desencadeados a partir da ocupação da Fazenda Capim, explorada ilegalmente pela Empresa Cutrale, gerou uma série de questionamentos e dúvidas em relação à Reforma Agrária e ao MST. Embora tenhamos nos posicionado publicamente por meio de notas e declarações, decidimos construir na região de Iaras, uma atividade com amigos, apoiadores da nossa Luta, com o objetivo de denunciar a utilização de terras públicas por diversas empresas privadas, como a Cutrale (laranja), Luarte, Eucatex, Luacel (eucalipto e pinus) entre outras.

O MST está presente na região desde de 1995. Hoje 350 famílias estão assentadas, fruto da luta do MST, no entanto outras 450 famílias permanecem acampadas em luta exigindo do Incra e do Governo Federal retomar das empresas privadas as terras públicas para fins de Reforma Agrária.

Convidamos a todos/as a participarem deste ato, no dia 29 de outubro de 2009.  A concentração será as 10:00 horas, na Escola Popular Rosa de Luxemburgo (sede da antiga Fazenda Agrocentro), de onde sairemos para o ato, que se realizará na área social do assentamento Zumbi dos Palmares, as 14:00 horas.

Orientação de como chegar:
Rodovia Castelo Branco, no Km 280, logo após o pedágio, a direita antes do Posto Taquarí, possui uma estrada de terra, seguir reto até encontrar o Assentamento Zumbi dos Palmares(cerca de 17 Km ).
A partir daí, a orientação é seguir para a Escola Rosa de Luxemburgo, para a concentração, a estrada será identificada com placas da Escola (cerca de 15 a 20 Km ).

Faremos também um almoço e na parte da tarde seguimos para a realização do Ato.

Ataque ao MST beneficia a Destruiçâo Ambiental

"Ataque ao MST beneficia agronegócio"

 

 

 

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21 de outubro de 2009

 

O deputado Ivan Valente (PSOL/SP) subiu à tribuna da Câmara nesta quarta-feira (21/10) para contestar o discurso dos ruralistas, do DEM e dos tucanos logo após a leitura do requerimento que cria a chamada CPI do MST. Para Ivan Valente, a CPI visa fortalecer o agronegócio, combater a Reforma Agrária e criminalizar o legítimo direito de organização dos trabalhadores rurais Sem Terra.

 

Leia a íntegra do pronunciamento:

 

"Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, a leitura dessa CPI, nesse momento, mostra que o poder de um setor econômico da sociedade, o agronegócio, associado a um outro da mídia brasileira conservadora, fazendo lavagem cerebral, direcionando reportagens, leva à recriação da CPI, porque já houve uma CPI Mista do MST aqui, há menos de 4 anos, que não investigou coisa alguma. Isso é uma vergonha e mostra o conservadorismo, a hegemonia do agronegócio.

 

Sr. Presidente, o que está acontecendo de verdade aqui é a criação de uma CPI, não só contra o MST, mas contra a reforma agrária no Brasil. Está se criando uma CPI aqui a favor do agronegócio, da monocultura e para criminalizar um movimento social no nosso País. A luta vai ser também criminalizada, assim como a reivindicação. É a lógica que existe neste momento, ou seja, criminalizar os movimentos sociais.

 

Tínhamos que investigar por que um setor que se volta só para a monocultura, para a exportação, para a reprimarização do País. Quero investigar as isenções milionárias, os incentivos à exportação, o adiamento e o cancelamento de dívidas do Banco do Brasil para uma setor que já é ultraprivilegiado no nosso País.

 

Por isso, Sr. Presidente, entendemos que atrás disso tem uma campanha midiática.

 

Inclusive a CNA produziu ou encomendou uma pesquisa ao Ibope que é uma vergonha em matéria de demonstração de produtividade inclusive do setor agrícola.

 

E eu queria dizer neste momento, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, que não precisa ser lutador, aliado ou admirador do MST para dizer que ele tem razão. Tenho aqui em mãos o artigo do ex-Ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, que eu vou colocar nos Anais desta Casa, insuspeito, alguém do PSDB para dizer o seguinte, que o MST talvez seja o movimento mais conhecido de defesa dos pobres deste País.

 

Em segundo lugar, as terras que foram apresentadas na televisão da Cutrale são reivindicadas pelo Incra como terras griladas. E isso a imprensa não fala, que uma grande exportadora de laranjas ocupa terra grilada no nosso País. Isso é crime. Isso precisa sim ser criminalizado. Em terceiro lugar, que aquela demonstração, se há críticas há fazer, era um combate à monocultura, quer-se-ia mostrar que se pode plantar outras coisas também nesse processo.

 

Sr. Presidente, a verdade é que rigorosamente a pequena propriedade no nosso País, a agricultura familiar, como diz o próprio artigo do Bresser Pereira, é responsável por três quartos da mão-de-obra utilizada no campo, ocupando apenas um quarto das áreas cultiváveis. Essa é que é a relação.

 

Por isso, Sr. Presidente, entendemos que essa movimentação que se faz para recriarmos a CPI é, na verdade, a lógica da criminalização do movimento social e da luta. Peço aos Deputados e Senadores que assinaram isso, que assinem, sim, uma CPI para assinar os privilégios deste País, os ganhos milionários com juros e amortização da dívida pública. Está lá a CPI boicotada pela maioria dos Partidos.

 

Essa, sim, destina 282 bilhões de reais do ano passado para juros e amortizações. Isso ninguém quer investigar. Agora, uma entidade que usou 5 ou 10 milhões precisa ser investigada. Não é nada disso. Temos de investigar o que faz e a lógica do agronegócio, que, aliás, é a mesma lógica que se está analisando na Comissão Especial que analisa o Código Florestal em nosso País.

 

O que se quer ali é revogar toda a legislação ambiental, que vai do sistema de unidade de conservação, o código florestal, a lei de crimes ambientais, o sistema nacional de meio ambiente, tudo por pressão do agronegócio dominado por ruralistas, que chegam aqui eleitos. Cento e vinte, 130 Parlamentares formam uma bancada específica, tencionam o Congresso e o Governo. Aqui queremos dizer claramente: somos radicalmente contrários a este tipo de CPI, porque o que ela visa é criminalizar o movimento social e a defesa da propriedade, e não da vida.

 

O que se defende aqui é que a propriedade está acima da vida. É o nosso repúdio, Sr. Presidente.

 

Câmara dos Deputados, 21 de outubro de 2009."